quinta-feira, 26 de maio de 2016

JOSÉ GONÇALVES

"Quando desembarcou no Brasil, em 1813, ele tinha entre 11 e 12 anos. Fazia parte de uma geração de meninos portugueses que vinham tentar a sorte no Rio de Janeiro, sede da monarquia desde 1808. Começou trabalhando como caixeiro. Em 1839 já havia construído fortuna. Atuava em Cabo Frio, “cuidando de seus interesses e do seu sogro João Moreira”. Foi quando fez uma petição ao chefe de polícia solicitando proteção: sentia-se ameaçado por ter que cobrar altas quantias a devedores. Sua presença em Cabo Frio, justamente no período em que o tráfico deslocou-se para lá, é sintomática. Desde que o tráfico de escravos para o Brasil se tornara ilegal, em 1831, com a “lei Feijó-Barbacena” – primeira proibição de entrada de escravos africanos nos portos brasileiros – cresciam os desembarques clandestinos na região. Tornou-se negociante conhecido e poderoso. Possuía armazém na boca da Barra, próximo da Fortaleza São Matheus, fazenda na Bahia Formosa e chácara no Cercado da Restinga. Tinha ainda um considerável patrimônio em ações e era proprietário de uma chácara em São Cristóvão, na sede da Corte – o que lhe garantia bom trânsito entre as autoridades. Quando D. Pedro II esteve em Cabo Frio, em 1847, José Gonçalves emprestou dinheiro e cedeu móveis para a recepção, destacou empregados para ajudarem nos preparativos e emprestou o lancha Rival para o deslocamento do imperador. José Gonçalves contava com excelente organização para realizar o tráfico clandestino – armazéns, trapiche e pontos de desembarque na Bahia Formosa e na Ponta das Emerências. Seu sócio era o comendador José Antonio dos Guimarães, que ocupou os cargos de juiz de paz e presidente da Câmara de Cabo Frio. Ambos eram proprietários de vasta extensão de terras, o que possibilitava o desembarque e o transporte dos africanos até o ponto de revenda sem maiores transtornos. Em 1850, o governo imperial adotou uma política mais severa de combate ao tráfico de africanos e aprovou a chamada lei Eusébio de Queirós. Em 20 de janeiro do ano seguinte, uma força policial invadiu as terras de José Gonçalves. A operação teria sido determinada pelo próprio Eusébio de Queirós, ministro e secretário de Estado dos Negócios da Justiça. As propriedades foram arrombadas, saqueadas e os bens confiscados pelo governo. José Gonçalves escapou da prisão por pouco. As buscas ao traficante continuaram. Um ano mais tarde, em 1852, sua chácara na rua Nova do Imperador, nº 17, foi cercada por força policial, mas ele não foi encontrado. Quando se apresentou às autoridades, acompanhado de seu advogado e comitiva, foi preso, mas deu gratificação de 600 mil réis ao carcereiro para não ser colocado em “ferros”. Após ser absolvido no processo judicial, José Gonçalves intensificou sua campanha contra a “injustiça sofrida”. Passados 160 anos, seu nome ainda é bastante lembrado pelos descendentes de escravos nas atuais cidades de Cabo Frio e Armação dos Búzios. A Praia de José Gonçalves é conhecida como o local onde o traficante – que chegou criança e pobre ao Brasil para se tornar responsável pelo comércio e escravização de milhares de africanos – explorou seu último ponto de desembarque ilegal.
FONTES: http://www.revistadehistoria.com.br/secao/capa/injustica-seja-feita FOTOS: http://www.buziosonline.com.br/home/portugues/o-que-ver-e-fazer/as-praias/jose-goncalves.cfm

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